sábado, 19 de abril de 2014

O QUE É UMA BOA HISTÓRIA

O que faz com que algumas histórias sejam boas e outras não? Qual é o segredo do envolvimento do público? 
Estas perguntas podem merecer muitas respostas e eu me arrisco a dar algumas. 
Um dos atributos mais importantes numa boa história é que ela seja boa. Muita gente se arvora a escrever sobre coisas que não mobilizam emocionalmente nem a si mesmas. Uma boa história, no meu modesto entendimento, deve seduzir quem escreve, inquietar, instigar. Deve tratar de um assunto que seja bom.
E o que é um assunto bom?
Um bom assunto trata de questões arquetípicas, mitológicas, ainda que prosaicas. É por isso que um bom assunto reverbera. Ele é profundo, ainda que superficial. É verdadeiro, legítimo, atômico, holográfico.
Uma boa história começa com a necessidade de se dizer algo que importe, que acrescente, que modifique. 
A forma entra a serviço do assunto. Quem conta história deve saber claramente o que quer dizer. 
É verdade que muitas vezes não sabemos o que queremos dizer. Ouvimos vozes difusas e vamos dando vazão a elas, até que a sua síntese se esboce, se estabeleça de forma soberana. Muitas vezes, para chegar a este ponto, o escritor, o dramaturgo, precisa dar linha à pipa. Deixar a sua voz interior falar sem restrições. Vomitar a sua alma para entender seus movimentos. Depois é abrir mão dos excessos, das gorduras, dos ruídos, das perfumarias. Deixar o essencial, para que possa ser mesmo essencial. 
A forma da narrativa está a serviço da história. Vai aos poucos revelando a sucessão de ampliações e reflexos do tema essencial, de tal maneira que ele ganhe toda a sua dimensão possível e, especialmente, a sua dimensão impossível. A dimensão desconhecida de todo o conhecido. Para que a vida volte a surpreender e encantar. A boa história estabelece um gradual encantamento, tecendo caminhos inusitados para a expressão do espírito humano, que está cansado de se ver reduzido a clichês fáceis e entediantes.
Todo assunto é novo através da forma. A forma mobiliza enfoques únicos sobre os assuntos, disparando reações novas em cada espectador da arte.

Trocando em miúdos, o autor deve se permitir fluir, mas deve trabalhar no resultado dessa fluência. Há uma certa presunção em nós que acreditamos que a nossa intuição nos permita parir obras acabadas. Há trabalhos e retrabalhos para se chegar ao essencial.   O que não interessa é arte feita com pressa.